Produtores de mel pedem apoio para enfrentar efeitos do tarifaço dos EUA

-
- IMAGEM DIVULGAÇÃO
O setor produtivo de mel indicou ao governo federal que a base da cadeia, em especial os cerca de 500 mil pequenos apicultores do país, precisam de uma série de medidas para tentar neutralizar os efeitos do tarifaço dos Estados Unidos. Os produtores querem melhorias no acesso às compras governamentais e sugeriram que parte das 50 mil toneladas que deixarão de ser vendidas aos americanos possa virar estoque público.
Os criadores de abelhas também pediram apoio do governo para incentivar o consumo de mel no país, limitado a 65 gramas por pessoa por ano, com divulgação e campanhas publicitárias nas redes oficiais de médio e longo prazos. Com pouco mercado interno, 80% da produção nacional, que está próxima de 90 mil toneladas anuais, precisa ser exportada. Mais da metade dos embarques vão para os EUA, que incluíram o produto na lista da sobretaxa de 50%.
A alta dependência do mercado americano nublou o cenário dos apicultores brasileiros. Ainda não há efeitos na ponta, mas a expectativa é que o preço recebido pelos produtores possa cair 30% com a sobre oferta interna causada pela interrupção das vendas aos EUA.
O cálculo leva em conta também descontos que exportadores ofereceram aos americanos para manter os negócios. A preocupação é que a conta recaia sobre o valor do mel pago aos produtores. Atualmente, eles recebem de R$ 10 a R$ 12 por quilo, mas o preço pode cair a R$ 7, disse Sérgio Farias, presidente da Confederação Brasileira de Apicultura (CBA).
“A partir de agora que as coisas vão começar a acontecer”, afirmou ao Valor. A saída é trabalhar pela ampliação do mercado interno e, depois, tentar diversificar a exportação, completou. “Precisamos criar uma cultura de consumo local”, completou.
Estados do Centro-Oeste estão em plena “safra”, com a retirada do mel das colmeias até outubro. A produção no Nordeste, que tem o diferencial por ser majoritariamente orgânica e agradar consumidores americanos e europeus, vai de novembro a março. “De toda forma, o produtor terá prejuízo nesta safra. Se não vender, não tem dinheiro. Se vender, o preço fica muito abaixo”, afirmou Farias.
O prejuízo estimado do tarifaço é de até US$ 250 milhões caso as 50 mil toneladas programadas não sejam embarcadas. No plano de contingência anunciado pelo governo nesta semana, as linhas de crédito e o retorno tributário deverão atender à indústria exportadora, disse Farias, mas o produtor continuará com “a corda no pescoço”. A entidade apresentou uma lista de pedidos ao vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin.
A indicação positiva do pacote de medidas foi a ampliação das compras governamentais. A CBA, no entanto, apontou a necessidade de alterar a caracterização do mel para ampliar a demanda do produto no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). O objetivo é que ele seja caracterizado como suplemento alimentar e não simplesmente equiparado ao açúcar industrial. A medida abriria caminho para que o mel possa ser utilizado mais vezes no cardápio da merenda escolar, revelou Farias.
“Nem tudo que é doce é açúcar. O mel é totalmente diferente do açúcar, não se pode comparar. O mel é rico em vitaminas, sais minerais, é um alimento”, avaliou. A entidade sugeriu interlocução com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e o Conselho Federal de Nutrição (CFN) para mudar essa definição oficial no PNAE e levar em consideração as propriedades naturais do mel benéficas à saúde humana.
“Esta iniciativa traria segurança alimentar nas escolas, inclusive, na formação de um mercado consumidor futuro consciente da importância do mel e da preservação ambiental com a polinização feita pelas abelhas, bem como uma renda de valor agregado aos apicultores da agricultura familiar”, diz ofício entregue a Alckmin.
Farias disse que terá uma reunião em breve com a Conab para falar sobre a possibilidade de compra pública de mel para formação de estoques. Segundo ele, o produto pode ser armazenado por até dois anos se for acondicionado em local adequado, com clima controlado.
Os produtores ainda pediram a suspensão dos vencimentos de parcelas do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) de 2025 para a apicultura e abertura de linha de crédito específica para suportar possível queda nos preços recebidos pelo mel.
“O grande problema é que mais de 90% dos apicultores são da agricultura familiar, não têm condições de estocar o mel. Eles precisam vender, faz parte do dia a dia, da renda. Não podem esperar seis meses a um ano para vender o mel”, explicou o presidente da CBA.
“O governo não precisa nos dar dinheiro se subsidiar a compra. O tarifaço é passageiro, em algum tempo vai passar, mas nosso produtor precisa do apoio”, completou.
A lista também inclui isenção de impostos federais para cooperativas de pequenos produtores para a venda do mel no varejo e o apoio do governo federal para aprovação de um projeto de lei que regula o uso da palavra “mel” nas embalagens de alimentos que, teoricamente, tiveram adição do produto na sua formulação. A ideia, disse Farias, é defender uma adição mínima de mel aos preparados, medida já existente para os sucos naturais de frutas.
A entidade pediu alterações normativas para facilitar a regularização da produção daqueles apicultores que não têm propriedade rural e, consequentemente, documento oficial do imóvel, o que dificulta a obtenção do CAF (Cadastro Nacional da Agricultura Familiar), necessário para participar de políticas públicas, como as compras governamentais.
A confederação pediu ainda que as federações estaduais de apicultores e meliponicultores possam associações e cooperativas que tenham CAF jurídica em contratos com o governo para fornecimento de mel via Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) Institucional.
Farias disse que já há venda de mel para programas públicos, mas de forma tímida. No Distrito Federal, o governo local vai comprar 13 toneladas do produto em 2025 para iniciar a inserção na merenda escolar.
“Esse conjunto de medidas pode tirar a corda do pescoço do apicultor. Se isso for implementado, podemos depender menos do mercado externo”, concluiu o dirigente.
Fonte: Globorural.globo.com

Deixe seu comentário